Os aplicativos de hospedagem têm ganhado cada vez mais espaço e importância, tanto para os hóspedes como para seus anfitriões (proprietários).
Trata-se de uma comunidade aberta, com pessoas de todas as partes do mundo, as quais, por meio de uma plataforma de aluguel de hospedagens, permitem que qualquer pessoa disponibilize ou reserve acomodações, por curta duração de tempo, oferecendo alternativas às hospedagens tradicionais e apresentando, em muitos casos, ganhos financeiros e descontos.
Devido ao seu rápido crescimento e difusão, várias discussões sobre sua legalidade e possibilidade foram instauradas, sobretudo relacionadas aos aluguéis em condomínios, ou seja, conflito entre a finalidade residencial do condomínio e o exercício do direito de propriedade dos condôminos.
Tal discussão chegou à Quarta Turma do STJ que, em 20/04/2021, julgou o Recurso Especial nº 1.819.075-RS, que teve origem em Porto Alegre (RS), por meio de ação ajuizada pelo Condomínio contra um de seus condôminos, visando obstar a atividade de hospedagem por meio de aplicativos, já que teria trazido perturbação à rotina do espaço residencial e insegurança aos demais condôminos. No caso, a empresa AIRBNB IRELAND UC integrou o processo como assistente.
De acordo com o julgado, esses aplicativos estabelecem um contrato de hospedagem atípico, e não deve se confundir com os contratos tradicionais regidos pela Lei de Locações nº 8.245/91 ou pela Lei nº 11.771/2008, que regula as hospedagens profissionais por hotéis, pousadas etc.
Ainda, a decisão ressaltou que deve haver harmonização entre o direito de propriedade dos condôminos/anfitriões com os direitos à segurança, ao sossego e à saúde dos demais condôminos [ainda mais em tempos de pandemia].
Assim, por maioria de votos, concluiu-se que, para o caso concreto, ocorreu a alteração da destinação residencial do condomínio, atribuída pela Convenção, devendo tal conduta ser vedada. Com isso, o Recurso Especial não foi provido.
Portanto, definiu-se que: caso a convenção do condomínio preveja somente a destinação residencial das unidades, os proprietários não poderão alugar seus imóveis por meio de plataformas digitais.
Aqui vale registrar o voto vencido do Relator, Ministro Luis Felipe Salomão, que, de forma contrária, entendeu que essa atividade não poderia ser enquadrada como estritamente comercial, considerando que haveria violação do direito de propriedade caso os condomínios pudessem vetar a locação. Segundo o Ministro, o condomínio poderia adotar mecanismos para garantir a segurança – como o cadastramento de pessoas na portaria –, mas não seria possível impedir a atividade de locação pelos proprietários.
De todo modo, restou vencedor o entendimento de que, para que não haja o desvirtuamento da finalidade condominial, é necessário haver expressa autorização para a hospedagem por aplicativos na Convenção do Condomínio, que possui força normativa para tanto.
Vale esclarecer que essa decisão está restrita às partes que participaram do processo judicial, não afetando terceiros. Contudo, acena como um primeiro posicionamento sobre essa polêmica questão e que, certamente, servirá como guia para o julgamento de outras ações judiciais pelas instâncias inferiores.
Segundo o Dr. Tiago Cantuária, sócio da Cantuária Ribeiro advogados, até que essa questão seja pacificada pelo Judiciário pátrio ou até que ocorra sua regulamentação, recomenda-se, para que se tenha maior segurança jurídica, que os Condôminos tratem do assunto de forma expressa na Convenção Condominial, fazendo constar a vontade democrática dos proprietários, de forma a permitir ou vedar as locações por aplicativos, sendo que tal alteração/inclusão deverá ser realizada por assembleia e com a aprovação por maioria qualificada [2/3 das frações ideais], tudo conforme art. 1.351 do Código Civil Brasileiro.
Autor: Dr. Tiago Cantuária Novais Ribeiro – Advogado sócio da Cantuária Ribeiro advogados